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A passagem bíblica de Gálatas 1.6,7 parece não estar muito clara na língua portuguesa: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo”. A tradução adotada aqui é a da ARA (Almeida Revista e Atualizada), mas o mesmo acontece nas demais versões em português que traduzem “para outro evangelho, o qual não é outro”. Afinal, o “outro evangelho” é ou não é outro?
Em português o adjetivo “outro” é “outro”, e nada mais, ou seja, sempre expressa o sentido de diverso ou diferente do primeiro. No grego temos állos e héteros. O adjetivo héteros é o outro de natureza diferente ou contrária ao verdadeiro; enquanto állos é o outro de mesma substância e qualidade do verdadeiro. É como se Paulo dissesse aos gálatas: “Vocês estão mudando para um evangelho que não é da mesma natureza do evangelho de Cristo”.
Este modo de interpretar Gálatas 1.6,7 não é novo. A. T. Robertson (1863-1934), um grande erudito do Novo Testamento, insistia na distinção onde Paulo não admite dois evangelhos lícitos e toleráveis (ouk estin állo), mas classifica o “evangelho” judaizante (o evangelho de Cristo mesclado com práticas judaicas [cf. At 15.1; Cl 2.16,17]) como héteros, radicalmente diferente do único e verdadeiro evangelho.[1] Portanto, Gálatas 1.6,7 pode ser lido mais ou menos assim: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho [de substância diferente], o qual não é outro [da mesma substância], senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo”. Os gálatas estavam abandonando esse evangelho em favor de um diferente, um que proclamava a fé mais as obras da lei como o caminho de salvação.[2]
Segundo Robertson, encontramos algo semelhante a Gálatas 1.6,7 no texto de 2Coríntios 11.4[3]: “Se, na verdade, vindo alguém, prega outro [állos] Jesus que não temos pregado, ou se aceitais espírito diferente [héteros] que não tendes recebido, ou evangelho diferente [héteros] que não tendes abraçado, a esse, de boa mente, o tolerais”. O que, por sua vez, também acha seu complemento em Gálatas 1.8,9: “Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema”. Para Paulo, o evangelho de Jesus é único e incomparável!
Concluindo: Tenho em minhas mãos O Livro de Mórmon. Ele traz na capa o subtítulo: um outro testamento de Jesus Cristo. Com certeza, esse outro testamento de Jesus Cristo não é állos, mas héteros.[4]
Apêndice:
Quando Jesus diz em João 14.16: “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco”, o adjetivo “outro” de João 14.16 também é állos, isto é, um outro de mesma substância e natureza. Temos aí um bom argumento para refutar a tese das testemunhas de jeová contra a pessoa e divindade do Espírito Santo. Na obra “Let Your Name Be Sanctified”, está escrito: “O santo espírito, porém, não tem nome pessoal. A razão disso é que o santo espírito não é uma pessoa inteligente. Trata-se de uma força impessoal, invisível e ativa, que encontra sua fonte e seu abastecimento em Deus Jeová e que este emprega para executar a sua vontade”.[5]
As Escrituras atribuem ao Espírito Santo predicados da personalidade, como: inteligência (1Co 2.10); vontade (1Co 12.11) e descreve-o como pessoa divina com nomes divinos (Mt 28.19; At 5.3; 1Co 3.16; 2Co 3.17); obras divinas (Sl 104.30 – criação; Sl 139 – onipresença); honra divina (Mt 12.31; 2Co 13.13).
Em João 14.16 Jesus ensina que o Espírito Santo é da mesma natureza dele.
Marcelo de Oliveira
[1] A. T. Robertson. Word pictures in the New Testament: the epistles of Paul. Vol. IV. Grand Rapids: Baker Book House, 1931, p. 276,77; V. t. E. W. Burton. A critical and exegetical commentary: the epistle to the Galatians. Edinburgh: T & T Clark, 1977, p. 22,420-22. Para um ponto de vista diferente, consulte Richard N. Longnecker. Word biblical commentary: Galatians. Vol. 41. Nashiville: Thomas Nelson Publishers, 1990, p. 15.
[2] Cf. Guillermo Hendriksen. Comentário del Nuevo Testamento: Gálatas. Grand Rapids: SLC, 1984, p. 47.
[3] Robertson, op. cit., p. 276.
[4] Veja mais sobre os adjetivos állos e héteros em R. C. Trench. Synonyms of the New Testament. Grand Rapids: Baker Book House, 1989, p. 375-77; W. C. Taylor. Introdução ao estudo do Novo Testamento grego. 7ª ed. Rio de Janeiro: Juerp, 1983, p. 295.
[5] Citado por J. K. Van Baalen. O caos das seitas: um estudo sobre os “ismos” modernos. São Paulo: Imprensa Batista Regular, 1986, p. 193.
O “Outro Evangelho” – Gl 1.6,7
A passagem bíblica de Gálatas 1.6,7 parece não estar muito clara na língua portuguesa: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo”. A tradução adotada aqui é a da ARA (Almeida Revista e Atualizada), mas o mesmo acontece nas demais versões em português que traduzem “para outro evangelho, o qual não é outro”. Afinal, o “outro evangelho” é ou não é outro?
Em português o adjetivo “outro” é “outro”, e nada mais, ou seja, sempre expressa o sentido de diverso ou diferente do primeiro. No grego temos állos e héteros. O adjetivo héteros é o outro de natureza diferente ou contrária ao verdadeiro; enquanto állos é o outro de mesma substância e qualidade do verdadeiro. É como se Paulo dissesse aos gálatas: “Vocês estão mudando para um evangelho que não é da mesma natureza do evangelho de Cristo”.
Este modo de interpretar Gálatas 1.6,7 não é novo. A. T. Robertson (1863-1934), um grande erudito do Novo Testamento, insistia na distinção onde Paulo não admite dois evangelhos lícitos e toleráveis (ouk estin állo), mas classifica o “evangelho” judaizante (o evangelho de Cristo mesclado com práticas judaicas [cf. At 15.1; Cl 2.16,17]) como héteros, radicalmente diferente do único e verdadeiro evangelho.[1] Portanto, Gálatas 1.6,7 pode ser lido mais ou menos assim: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho [de substância diferente], o qual não é outro [da mesma substância], senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo”. Os gálatas estavam abandonando esse evangelho em favor de um diferente, um que proclamava a fé mais as obras da lei como o caminho de salvação.[2]
Segundo Robertson, encontramos algo semelhante a Gálatas 1.6,7 no texto de 2Coríntios 11.4[3]: “Se, na verdade, vindo alguém, prega outro [állos] Jesus que não temos pregado, ou se aceitais espírito diferente [héteros] que não tendes recebido, ou evangelho diferente [héteros] que não tendes abraçado, a esse, de boa mente, o tolerais”. O que, por sua vez, também acha seu complemento em Gálatas 1.8,9: “Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema”. Para Paulo, o evangelho de Jesus é único e incomparável!
Concluindo: Tenho em minhas mãos O Livro de Mórmon. Ele traz na capa o subtítulo: um outro testamento de Jesus Cristo. Com certeza, esse outro testamento de Jesus Cristo não é állos, mas héteros.[4]
Apêndice:
Quando Jesus diz em João 14.16: “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco”, o adjetivo “outro” de João 14.16 também é állos, isto é, um outro de mesma substância e natureza. Temos aí um bom argumento para refutar a tese das testemunhas de jeová contra a pessoa e divindade do Espírito Santo. Na obra “Let Your Name Be Sanctified”, está escrito: “O santo espírito, porém, não tem nome pessoal. A razão disso é que o santo espírito não é uma pessoa inteligente. Trata-se de uma força impessoal, invisível e ativa, que encontra sua fonte e seu abastecimento em Deus Jeová e que este emprega para executar a sua vontade”.[5]
As Escrituras atribuem ao Espírito Santo predicados da personalidade, como: inteligência (1Co 2.10); vontade (1Co 12.11) e descreve-o como pessoa divina com nomes divinos (Mt 28.19; At 5.3; 1Co 3.16; 2Co 3.17); obras divinas (Sl 104.30 – criação; Sl 139 – onipresença); honra divina (Mt 12.31; 2Co 13.13).
Em João 14.16 Jesus ensina que o Espírito Santo é da mesma natureza dele.
Marcelo de Oliveira
[1] A. T. Robertson. Word pictures in the New Testament: the epistles of Paul. Vol. IV. Grand Rapids: Baker Book House, 1931, p. 276,77; V. t. E. W. Burton. A critical and exegetical commentary: the epistle to the Galatians. Edinburgh: T & T Clark, 1977, p. 22,420-22. Para um ponto de vista diferente, consulte Richard N. Longnecker. Word biblical commentary: Galatians. Vol. 41. Nashiville: Thomas Nelson Publishers, 1990, p. 15.
[2] Cf. Guillermo Hendriksen. Comentário del Nuevo Testamento: Gálatas. Grand Rapids: SLC, 1984, p. 47.
[3] Robertson, op. cit., p. 276.
[4] Veja mais sobre os adjetivos állos e héteros em R. C. Trench. Synonyms of the New Testament. Grand Rapids: Baker Book House, 1989, p. 375-77; W. C. Taylor. Introdução ao estudo do Novo Testamento grego. 7ª ed. Rio de Janeiro: Juerp, 1983, p. 295.
[5] Citado por J. K. Van Baalen. O caos das seitas: um estudo sobre os “ismos” modernos. São Paulo: Imprensa Batista Regular, 1986, p. 193.
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